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Jun 24, 2020

Como prometido, a 2ª parte da conversa com o biólogo Paulo Gama Mota.

Paulo Gama Mota é biólogo, doutorado e professor na Universidade de Coimbra. Os seus interesses científicos têm sido o estudo do comportamento animal e a compreensão das suas causas evolutivas. O convidado foi também Director do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra até 2015, e é actualmente presidente da Sociedade Portuguesa de Etologia.

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Depois de, na primeira conversa, temos feito uma espécie de “viagem de reconhecimento” pela Biologia Evolutiva, nesta pudemos ir mais fundo em alguns aspectos deste fenómeno complexo.

Começámos por falar de uma das áreas de investigação do Paulo: as causas evolutivas para os comportamentos característicos de cada espécie, muitos deles em resultado da selecção sexual — como vão ver, a variedade de comportamentos é imensa. Isso levou-nos a falar do desenvolvimento da inteligência, e do estranho caso de alguns cefalópodes, como o polvo, um animal espantosamente inteligente mas tão distante de nós que há quem lhe chame “o mais próximo de uma inteligência alienígena que podemos encontrar”. Na 2ª metade da conversa, falámos de aspectos mais gerais da evolução por selecção natural, onde as coisas nem sempre são o que parecem. Discutimos, por exemplo, o mito de que a selecção natural produz sempre adaptações perfeitas (o que está longe de ser verdade) e uma proposta ainda mais contra-intuitiva: será que há características que evoluíram por por acaso, e não por seleção? Tudo isto devidamente condimentado por exemplos e perguntas que continuam por responder. 

 

Índice da conversa:

  1. Comportamento e ecologia comportamental
    1. Tipos de causalidade na Biologia
      1. Ensaio de Peter Medawar
    2. Seleção social (para lá da seleção sexual)
    3. Espécies que desenvolvem plasticidade de comportamento
  2. O cérebro enquanto adaptação flexível ao ambiente
    1. Os polvos que fundiam propositadamente as luzes do laboratório
    2. O que explica que o cérebro se tenha desenvolvido em algumas espécies (como a nossa)?
    3. Experiência referida de privação de comida: Minnesota Starvation Experiment
  3. O papel da sinalização na seleção sexual e noutros tipos de comportamento
    1. Papel da seleção por arrasto
    2. Sinalização sexual
      1. O caso dos auklets, aves do Alasca 
    3. Comportamentos “inter-específicos” (entre espécies)
      1. Exemplo das gazelas que sinalizam aos predadores
    4. Animais que imitam predadores
    5. Estratégias sexuais dos cabozes (peixes)
  4. Aspectos gerais da evolução 
    1. Mito de que a selecção natural produz adaptações perfeitas
      1. O caso do polegar do panda
      2. Livro: O Jogo dos Possíveis, de François Jacob 
      3. O caso do olho humano (também abordado no 1º episódio)
        1. Why every human has a blind spot - and how to find yours
        2. Outro teste
        3. Do it yourself do Exploratório de São Francisco
      4. Paisagem adaptativa
      5. O exemplo dos dodos
      6. Especialização e interdependência entre espécies 
      7. Órgãos vestigiais
      8. O caso do apêndice humano
      9. Porquê os tubarões não têm bexiga natatória (ao contrário dos peixes)
    2. Será que há características que evoluíram por deriva genética e não por seleção?
      1. A teoria da evolução por mutações neutras (Motoo Kimura)
      2. A tradição do  “mergulho para o solo” da tribo dos Vanuatu
      3. A tradição da tribo que come o cérebro dos adversários mortos
      4. A tribo que tem cegueira de cor
      5. Será o homo sapiens um caso neotenia (tipo de heterocronia)? 
        1. Sê-lo-ão os cães?
  5. Livros recomendados:
    1. A Evidência da Evolução, de Jerry A. Coyne
    2. Improbable Destinies: Fate, Chance, and the Future of Evolution (Inglés) First Edition Edición, de Jonathan B. Losos

 

Comentário do convidado sobre o ‘dilema obstétrico’ abordado no episódio anterior

“Há dois aspectos que tiveram desenvolvimentos desde a hipótese do dilema obstétrico de Washburn, que sugeria uma relação entre tamanho da pélvis e nascimento precoce. A pélvis seria constrangida pela locomoção e o nascimento precoce por causa do canal.

  1. Estudos anatómicos sugerem que a pélvis mais larga não causa uma locomoção mais difícil. MAs, há outros aspectos relacionados com a tensão no colo do fémur, que não permitem conclusões definitivas. Por outro lado, as comparações com Australopitechus são difíceis, do ponto de vista da biomecânica. Mas, há uma nova hipótese que tem menos a ver com o parto e mais com a gravidez. Uma pélvis larga dá menos sustentação ao feto e pode mais facilmente originar partos prematuros.
  2. Nascimento precoce - Dunsworth propôs que o problema não seria o tamanho do feto, mas o custo energético. Do que li, faz sentido, mas não inviabiliza o problema do tamanho da cabeça, que é proporcionalmente enorme, na nossa espécie, às 36 semanas (junto artigo que dá uma ideia). E o custo energético também não explica porque há tantos partos que correm mal na nossa espécie, ao contrário dos outros primatas. Acho que a hipótese de Washburn continua de pé, ainda que não seja toda a explicação.

Há um aspecto interessante que revela que o parto humano evoluiu em sociedades com sobreposição de gerações e forte apoio entre indivíduos do sexo feminino. Os nossos bébés são os únicos que nascem com a cabeça virada para a parte posterior da mãe. Em todos os outros primatas a cria nasce virada para o umbigo da mãe. E isso faz toda a diferença, porque esta pode ajudar o parto puxando para si. No caso humano isso poderia ser fatal, porque dobrava a cabeça para trás. Ou seja: o parto tem que ter ajuda de terceiros.”

 

Obrigado aos mecenas do podcast:

 

  • Carlos Martins, Corto Lemos, Joana Faria Alves, João Baltazar, Mafalda Lopes da Costa, Rogério Jorge, Salvador Cunha, Tiago Leite, Rui Oliveira Gomes, Duarte Dória, Margarida Varela
  • Abilio Silva, António Padilha, Carmen Camacho, Daniel Correia, Diogo Sampaio Viana, Francisco Fonseca, Helder Miranda, Joao Saro, João Nelas, Mafalda Pratas, Rafael Melo, Rafael Santos, Ricardo Duarte, Rita Mateus, Tiago Neves Paixão, Tiago Queiroz, Tomás Costa, José Soveral, João Almeida, André Oliveira, João Silveira, Miguel Cabedo e Vasconcelos, Joao Salvado, José Jesus, Ana Sousa Amorim, Manuel Martins, Maria Joao Braga da Cruz, Luis Belchior, João Bernardino, Sara Mesquita, Nuno Tiago Samelo, Ricardo Ribeiro
  • Duarte, Filipe Ribeiro, Francisco Aguiar , Francisco Arantes, Francisco dos Santos, Francisco Vasconcelos, Henrique Lopes Valença, Henrique Pedro, Hugo Correia, isosamep, Joana Margarida Alves Martins, Joao Diogo, Joao Pinto, Jose Pedroso, José Galinha, José Oliveira Pratas, JosÉ Proença, JoÃo Diogo Silva, JoÃo Moreira, JoÃo Raimundo, Luis Ferreira, Luis Marques, Luis Quelhas Valente, Marco Coelho, Mariana Barosa, Marise Almeida, Marta Baptista Coelho, Marta Madeira, Miguel Coimbra, Miguel Palhas, Nuno Gonçalves, Nuno Nogueira, Pedro, Pedro alagoa, Pedro Rebelo, Pedro Vaz, Renato Vasconcelos, Ricardo Delgadinho, rodrigo brazÃo, Rui Baldaia, Rui Carrilho, Rui Passos Rocha, Telmo, Tiago Costa da Rocha, Tiago Pires, Tomás Félix, Vasco Lima, Vasco Sá Pinto, Vitor Filipe, Ricardo Nogueira, Alexandre Almeida, Francisco Arantes, João Crispim, Paulo dos Santos, Élio Mateus, André Peralta Santos, João Pinho, Paulo Fuentez, Simão Morais, Andrea Grosso, Robertt, Fonsini, João Barbosa, Jose António Moreira, Luís Pereira, João Martins, Sérgio Catalão, Vasco Faden Araujo, João Castanheira, Cátia Prudêncio, Telmo Damião, Gerson Castro, Rodrigo Murteira Pedrosa, Alexandre Freitas, Andreia Esteves, Renato Mendes, Carlos Magalhães Lima, Maria Francisca Couto, Tomás Santos, Antonio Albuquerque, Natália Ribeiro, Pedro F. Finisterra, Francisco Santos, João M. Bastos, Rita Branco, Inês Grosa, Lara Pimentel, Natália Ribeiro, Joana Antunes, Lara Luís, Nelson Lopes, João Bastos, Nelson Poças, Tânia Marques, Fernando Sousa, Francisco López Bermúdez, Pedro Correia, Tiago Chança, MacacoQuitado, Paulo Ferreira, João Aires, Gabriela, Carlos Silveira, Ricardo Campos, Sérgio Vicente, Nuno Almeida, Mauro Ribeiro, Francisco Rocha, Inês Braga, André Balsas, Francisco Manuel Reis, Ricardo Leitao, Bruno Lamas, Danel Almeida, Albino Ramos, Inês Patrão, Luís Barbosa, Pedro Conceição, Patrícia Esquível, Telmo Felgueira, Mike Osaka, Tiago Gameiro

 

Esta conversa foi editada por: Martim Cunha Rego

Bio: Doutorado pela Universidade de Coimbra e Professor Associado, com agregação, do Departamento de Ciências da Vida da FCTUC. Os seus interesses científicos têm sido o estudo do comportamento animal e a compreensão das suas causas evolutivas, incluindo a nossa espécie. Em especial, interessa-se pela evolução de sinais sexuais, como a coloração nas aves, e a comunicação animal. Publica regularmente nas revistas mais importantes de comportamento animal e evolução. É investigador do CIBIO, onde coordena o grupo de investigação em Ecologia Comportamental e é Presidente da Sociedade Portuguesa de Etologia. A par da sua actividade científica e de ensino, interessou-se pela comunicação de ciência, aspecto que considera essencial na actividade de um cientista. Foi director do Museu Antropológico da FCTUC, do Museu Nacional da Ciência e da Técnica, e responsável pelo projecto e Director do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra (2006-2015), que recolheu inúmeros prémios nacionais e internacionais, pela excelência do projecto e da sua actividade. Comissariou várias exposições de ciência e coordenou vários projectos de ciência cidadã, sempre com a preocupação de aproximar os cidadãos da ciência.