Jun 5, 2019
Maria João Valente Rosa é professora na Universidade Nova de Lisboa, doutorada em Demografia e foi, até ao ano passado, directora da Pordata, uma base de dados de indicadores sobre Portugal disponibilizada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos.
A nossa conversa levou-nos, como é habitual, em várias direcções.
Em jeito de aperitivo, começámos por falar sobre a paixão da convidada, a Demografia, e da importância da literacia nesta área para uma sociedade informada e próspera.
A conversa em si foi, em grande parte, sobre a principal área de investigação da convidada: o envelhecimento demográfico a que assistimos actualmente no mundo desenvolvido, e em Portugal em particular.
A proporção de idosos face aos jovens tem vindo a aumentar em Portugal nas últimas décadas, em resultado do aumento da longevidade e, em menor grau, da diminuição da natalidade. Segundo o INE, o envelhecimento da sociedade vai continuar e só tenderá a estabilizar daqui a cerca de 40 anos
Este vai ser um desafio para as sociedades, mas a convidada realça duas coisas. por um lado, este número é enganador, porque a esperança de vida também aumenta (uma pessoa de 65 anos em 1960 tinha uma esperança de vida restante equivalente a uma de 72 hoje em dia). Por outro lado, o envelhecimento demográfico é sobretudo uma notícia positiva, tendo em conta que (i) o aumento do número de velhos deve-se ao aumento da longevidade e (ii) a própria diminuição da natalidade é, indirectamente, resultado do desenvolvimento económico dos países.
A questão da longevidade dava um podcast inteiro, claro, tantas as ramificações que tem. Falámos da enorme perda de valor social que é o actual sistema binário de trabalho (até aos 65 anos) seguido de entrada abrupta na reforma. E conversámos também sobre o modo, muitas vezes errado, como a sociedade lida com os velhos e os novos, e o que se pode melhorar.
Sobre a redução da natalidade, conversámos sobre vários aspectos. Esta questão é sempre um puzzle. A influência do rendimento sobre o número de filhos, por exemplo, parece confusa: queixamo-nos hoje de que não temos mais filhos porque falta de dinheiro, mas é nos países mais pobres que nascem mais crianças.
A explicação é que quando o nível de vida de uma sociedade aumenta muito, muda também a maneira como as pessoas vêem a natalidade: em países desenvolvidos (como Portugal), entre outras alterações, os filhos deixaram de ser vistos como mão-de-obra, por isso as “variáveis” da equação que usamos para decidir quantos filhos vamos ter alteraram-se drasticamente. Hoje, muito dificilmente a pessoa média quererá ter mais de dois filhos.
Significa isto que as medidas a tomar para aumentar a natalidade num país como Portugal terão que ser adaptadas a essa nova realidade. E foi sobre isso, sobretudo, que falámos. Por exemplo, mais do que tentar alterar o número de filhos que as pessoas desejam – que dificilmente serão mais do que 2 –, é importante agir sobre as restrições que as impedem de ter os filhos que quereriam.
Obrigado aos mecenas do podcast:
Agradecimento especial neste episódio: Salvador Cunha
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Ligações:
Índice de Literacia Estatística
Áreas de Portugal e Inglaterra (km²): 91,568 vs 130,395
Formação bruta de capital fixo
Fronteira entre Portugal e Espanha
WEF: The myth of an "ageing society"
Índice sintético de fecundidade
Inquérito à fecundidade - 2013
Livro sugerido: O Retrato de Dorian Gray - Oscar Wilde
Bio: Maria João Valente Rosa, professora universitária, nasceu em Lisboa em 1961. Doutorada em Sociologia, especialidade Demografia, pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Foi Directora da Pordata – Base de Dados de Portugal Contemporâneo – projecto da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) e coordenadora da área científica "População" da FFMS. Desempenhou funções de dirigente em organismos públicos dos Ministérios da Educação e da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Integra o Conselho Superior de Estatística (CSE) e o Comité Consultivo Europeu de Estatística (ESAC). É autora e coordenadora de inúmeros estudos publicados sobre a sociedade portuguesa. Entre estes, em 1999, "Reformados e Tempos Livres", edições Colibri-Inatel, e em 2012, no âmbito da colecção de ensaios da FFMS, "O envelhecimento da sociedade portuguesa" (nº 26).